O ROMBO DOS R$ 117 MILHÕES: O QUE ESTÃO ESCONDENDO DOS SERVIDORES DE MACEIÓ?
POR TIAGO HÉLCIAS

Quando a Polícia Federal bate à porta de um banco e o Banco Central decreta liquidação extrajudicial, a pergunta óbvia deveria ser: quem foi negligente o suficiente para colocar dinheiro público ali?
Mas em Maceió, como sempre, a pergunta tenta ser abafada — porque a resposta aponta diretamente para a Prefeitura.
Sim, estamos falando dos R$ 117 milhões do IPREV, dinheiro sagrado dos aposentados e pensionistas da capital, aplicado justamente no Banco Master — o mesmo banco que virou alvo de operação da PF e afundou em fraude, liquidez zero e gestão criminosa.
E a pergunta que ecoa pelas ruas é apenas uma:
Como é que o dinheiro da previdência de Maceió foi parar exatamente onde não deveria estar?
O INVESTIMENTO SEM GARANTIA – E A BOMBA-RELÓGIO QUE EXPLODIU
O IPREV decidiu aplicar R$ 117,9 milhões em títulos que não tinham cobertura do FGC.
Ou seja: se desse errado — e deu — o servidor iria pagar a conta. Literalmente.
Quando o BC decretou a liquidação do Banco Master, a ficha caiu:
os aposentados de Maceió podem ter perdido tudo.
E por quê?
Porque esses títulos eram exatamente aqueles ativos mágicos que prometem rentabilidade fácil, mas vêm sem manual de instruções, sem garantia e — pior — carregam cheiro de fraude.
Não por acaso, no mesmo momento em que o banco ruiu, a PF deflagrou a Operação Compliance Zero, com direito a prisão do dono da instituição, Daniel Vorcaro, e do sócio Augusto Lima.
Acusação?
Criação e negociação de títulos falsos.
Rombo nacional estimado: R$ 1,9 bilhão.
E Maceió, claro, estava lá dentro.
A CONSULTORIA-QUASE-ORÁCULO QUE RECOMENDOU O INVESTIMENTO
Mas a história fica ainda mais indigesta quando aparece o nome da consultoria Crédito e Mercado, a responsável por “aconselhar” o IPREV a mergulhar nos títulos do Banco Master.
Sabe aquela empresa que diz saber tudo sobre o mercado financeiro?
Então: essa mesma consultoria é alvo da Operação Rebote da PF.
Adivinha por quê?
Fraude em fundos de previdência.
Prejuízo: perto de R$ 400 milhões só no caso de Campos (RJ).
E mais: a contratação dessa consultoria em Maceió teria sido feita sem licitação.
Sem disputa.
Sem transparência.
Sem zelo.
E o mais perturbador: vereadores já questionam o paradeiro de uma suposta comissão de R$ 5 milhões ligada a essa aplicação.
Para onde foi?
Quem recebeu?
Por ordem de quem?
Silêncio.
Muito silêncio.
A DEFESA OFICIAL – E O DISCURSO QUE NÃO BATE COM A REALIDADE
A gestão JHC tenta dissipar o incêndio dizendo que:
- o IPREV é sólido;
- o patrimônio é de R$ 1,4 bilhão;
- os pagamentos estão garantidos;
- não há perda confirmada.
É a velha estratégia: “não é bem assim, calma, tudo está sob controle”.
Só que “calma” não paga prejuízo.
E “sob controle” não explica porque colocaram dinheiro dos servidores em um banco atolado em suspeitas.
Yes, o IPREV vai entrar na fila de credores.
Mas todo mundo sabe como funciona essa fila:
quanto mais longa, mais improvável é o ressarcimento integral.
E quem perde?
O servidor que dedicou 20, 30, 40 anos da vida ao município.
O CONTEXTO MAIOR – E O VELHO PADRÃO DE DESCASO COM PREVIDÊNCIAS MUNICIPAIS
O episódio de Maceió não é um ponto fora da curva — é o reflexo de uma prática nacional:
consultorias indicam aplicações arriscadas, gestores públicos aceitam sem questionar, e fundos de previdência viram caixas vulneráveis à ganância e ao improviso.
O caso do Banco Master apenas expõe, com holofotes, como o problema é estrutural — e como Maceió se encaixa perfeitamente nesse padrão de negligência.
AS PERGUNTAS QUE A PREFEITURA NÃO RESPONDE – MAS PRECISA RESPONDER
- Quem autorizou aplicar em um título sem FGC?
- Quem assinou a contratação da consultoria investigada pela PF?
- Por que não houve licitação?
- Qual foi exatamente a rota dos “R$ 5 milhões” em comissões?
- Por que a gestão ignorou os alertas nacionais sobre fundos fraudados?
- Se a consultoria já era investigada, por que não foi imediatamente rompido o contrato?
- Quem é politicamente responsável pelo risco imposto aos servidores?
E, talvez a maior pergunta de todas:
Se não houve erro, por que tanto esforço para justificar — e tão pouco esforço para explicar?
O QUE ESTÁ EM JOGO
Não estamos falando de um investimento comum.
Estamos falando de uma fatia de quase 10% do patrimônio previdenciário de Maceió.
Estamos falando da vida de servidores que dependem desse fundo para envelhecer com dignidade.
O rombo pode comprometer o futuro.
Pode pressionar as finanças públicas.
Pode exigir aporte extra do município — e aí, claro, a conta recai sobre o cidadão.
E, acima de tudo, compromete a confiança.
A confiança de quem acreditou que seu dinheiro estava seguro.
O ESCÂNDALO SÓ COMEÇOU
O caso ainda vai se desdobrar na Justiça, na PF, no BC, e — ou deveria — na Câmara Municipal.
Mas uma coisa já está clara:
Se R$ 117 milhões da previdência foram parar em um banco afundado em fraude, alguém precisa responder.
A população de Maceió merece saber:
não apenas o que aconteceu, mas quem permitiu que acontecesse.
Transparência não é favor.
É obrigação.
E quando o assunto é dinheiro de aposentado, o mínimo que se espera é responsabilidade — e não apostas no escuro travestidas de investimento.
Tiago Hélcias é jornalista com quase três décadas de vivência no front da notícia — do calor das ruas aos bastidores da política. Atua como apresentador, redator e produtor de conteúdo em rádio, TV e plataformas digitais. É pós-graduado em Marketing Político, especialista em Comunicação Assertiva e mestrando em Comunicação Digital em Portugal.
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