A COP30 DA HIPOCRISIA: VERDE NO DISCURSO, CINZA NOS GASTOS
POR TIAGO HÉLCIAS

Belém respira expectativa. Nos próximos dias, a capital paraense vira o centro do mundo com a chegada da COP30, o grande palco onde líderes globais vão falar — de novo — sobre salvar o planeta, conter o aquecimento global e proteger a Amazônia. Tudo muito bonito no discurso. O problema é o mesmo de sempre: quando o microfone desliga, o verde da sustentabilidade dá lugar ao cinza da burocracia e ao preto das cifras escondidas.
O evento que promete representar o compromisso do Brasil com o futuro do planeta está sendo construído sobre uma base tão nebulosa quanto o ar poluído das metrópoles que ele pretende combater. Um relatório da Transparência Internacional – Brasil escancarou o que muita gente já suspeitava: as obras da COP30, orçadas em R$ 2,8 bilhões (só em infraestrutura) e que somam R$ 4,2 bilhões em investimentos federais, estão envoltas em opacidade.
Sim, o encontro mundial do clima, sediado em plena Amazônia, não consegue nem ser transparente com as próprias licenças ambientais.
O “apagão” da transparência
O relatório da Transparência Internacional mostra que o Governo Federal, o Estado do Pará e a Prefeitura de Belém falham em divulgar informações básicas. Licenças ambientais incompletas, convênios com o BNDES e Itaipu sem clareza, ausência de registros de audiências públicas e total falta de dados abertos.
É uma ironia monumental: o evento que vai discutir a preservação da Amazônia parece ter aprendido rápido com o desmatamento — está derrubando árvores de transparência.
Renato Morgado, gerente de projetos da organização, resumiu bem: “Nos preocupa a falta de informação sobre os processos de licenciamento ambiental, sobretudo porque estamos falando de um evento voltado a enfrentar a crise climática.”
Traduzindo: é como promover um simpósio sobre honestidade e esconder o caixa.
Páginas coloridas, transparência cinza
Todos os entes públicos criaram páginas oficiais sobre a COP30. Bonitas, coloridas, cheias de logos e promessas. Mas, ao tentar navegar nelas, o cidadão cai em um labirinto de links quebrados, erros de certificado e PDFs que parecem ter sido escondidos de propósito.
A transparência existe, sim — mas apenas para quem tiver tempo, paciência e fé o bastante para decifrar o caminho da informação.
É o velho roteiro brasileiro: muito discurso de “governança”, pouca prática de gestão.
A ironia amazônica
A COP30 poderia ser o símbolo de um Brasil que amadureceu, que aprendeu com os escândalos e com as velhas mazelas da política. Mas não. O evento que nasceu para celebrar a sustentabilidade virou vitrine da contradição institucional: fala-se em salvar o planeta, mas não se consegue sequer mostrar o extrato das obras.
O Brasil se apresenta ao mundo como guardião da floresta, mas o que se vê é a mesma prática — o verde sendo usado como cortina para esconder o cinza da má gestão.
E o povo de Belém, que deveria ser o protagonista dessa história, assiste de longe, sem saber quanto custa cada promessa plantada no solo amazônico.
O legado que se anuncia
A Transparência Internacional recomenda a criação de um portal único de informações, com dados abertos e atualizados em tempo real. Algo básico, mas que aqui ainda soa como utopia.
Sem isso, o legado da COP30 corre o risco de não ser sustentabilidade, mas desconfiança.
E é nesse cenário que o contraste se torna ainda mais grotesco: enquanto bilhões escorrem sem explicação em nome do “combate às mudanças climáticas”, o próprio presidente Lula aparece — junto com a primeira-dama Janja — dançando em um iate de luxo, em uma cena que mais parece saída de um comercial de champanhe do que de um governo que se diz “dos pobres”.
O “pai dos pobres”, que sempre acusou os ricos de viverem em bolhas de privilégio, agora flutua serenamente sobre uma delas — paga, quem sabe, com o suor do mesmo povo que ele jura defender.
Um símbolo perfeito para o Brasil de sempre: o discurso moralista, a retórica bonita, e o rastro de contas que ninguém sabe quem paga.
Se a COP30 quer discutir o futuro do planeta, talvez devesse começar discutindo o futuro da coerência — um recurso tão escasso por aqui quanto a honestidade orçamentária.
Acesse o relatório completo da Transparência Internacional – Brasil
Para quem quiser conferir os dados originais, o relatório está disponível gratuitamente em PDF:
“COP30 in Belém: Billions in Works, Transparency Lacking” — Transparência Internacional – Brasil
Tiago Hélcias é jornalista com quase três décadas de vivência no front da notícia — do calor das ruas aos bastidores da política. Atua como apresentador, redator e produtor de conteúdo em rádio, TV e plataformas digitais. É pós-graduado em Marketing Político, especialista em Comunicação Assertiva e mestrando em Comunicação Digital em Portugal.
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