QUANTO VALE UM GOVERNADOR? EM SERGIPE, SALÁRIO É O MAIOR DO BRASIL E SUPERA O DO PRIMEIRO-MINISTRO DE PORTUGAL

POR TIAGO HÉLCIAS

De tempos em tempos, como prato requentado que insiste em voltar à mesa, reaparece nas manchetes e redes sociais a lista com os salários dos governadores do Brasil.

Parece notícia velha, mas não é. Porque, convenhamos, nunca é demais relembrar quanto custa manter as engrenagens da política funcionando — e, principalmente, quem banca a conta.

Pois bem: O meu Sergipe, o menor estado da federação, é justamente o que paga o maior salário a um governador no Brasil: R$ R$ 46.366,19. Isso mesmo. O contracheque do governador Fábio Mitidieri (PSD) é maior que o de Tarcísio de Freitas em São Paulo, maior que o de Ratinho Júnior no Paraná, maior que o de Jerônimo Rodrigues na Bahia e se equivale ao valor pago de um ministro do STF, é mole?

Quem define esse valor?

Aqui está o ponto central cara pálida: não há uma métrica técnica, muito menos científica, para definir quanto deve ganhar um governador. O que existe é a velha prática de políticos legislando para políticos, em causa própria.

Uma mão lava a outra

Funciona assim: a Assembleia Legislativa aprova uma lei que define o salário do chefe do Executivo estadual. Os mesmos deputados que aprovam o reajuste do governador também aprovam o próprio salário, já que os vencimentos parlamentares caminham lado a lado.

É quase um clube fechado, onde os donos da caneta escrevem as próprias regras do jogo. Não existe participação popular, não existe consulta pública, não existe critério claro baseado em PIB, população, ou complexidade administrativa. É política remunerando a si mesma.

O contraste que incomoda

Vamos colocar em perspectiva:

  1. Em São Paulo, o maior estado do país, o governador ganha R$ 36.301,53.
  2. No Paraná, um estado industrializado, com peso econômico relevante, Ratinho Júnior recebe R$ 33.763,00.
  3. Na Bahia, com mais de 15 milhões de habitantes, Jerônimo Rodrigues embolsa R$ 36.894,89.
  4. Já em Sergipe, com menos de 2,5 milhões de habitantes, o salário passa dos R$ 46 mil.

É ou não é um contrassenso?

Quanto custa um governador?

A questão não é apenas “quanto vale o trabalho de um governador”, ou seja, quem sou eu pra questionar o valor de cada um.

Porém, nós sabemos que esse salário fixo é apenas a ponta do ice berg. Há outros privilégios. Tem carro oficial, equipe de segurança, assessores, viagens, diárias e todo um aparato mantido com dinheiro público.

E aí vem a pergunta incômoda: qual é o impacto financeiro real para o menor estado pagar o maior salário de governador do Brasil?

Uma régua desregulada

Não se trata aqui de diminuir a importância da função de um governador. A vida pública, teoricamente, exige dedicação integral. Mas o problema é a falta de critério. Se houvesse uma tabela nacional, ajustada pela população e pela complexidade administrativa de cada estado, talvez fizesse sentido. Mas não: cada Assembleia Legislativa cria sua própria régua, e o resultado é o que vemos — um estado pequeno com um salário de luxo.

Brasil Vs Europa

Estando em Portugal, a comparação é inevitável. O Primeiro-Ministro, Luís Montenegro, tem um salário base de cerca de 5.800 €, o que convertido hoje equivale a aproximadamente R$ 36.200,00. A esse valor somam-se as chamadas despesas de representação, que elevam o rendimento bruto mensal para 8.768,65 € — algo próximo de R$ 54.800,00.

Há uma diferença clara entre o que é vencimento fixo e o que são acréscimos relacionados à função. E mesmo com esses adicionais, o assunto é motivo de debate constante: a imprensa acompanha, a oposição questiona, e a sociedade cobra resultados à altura do que se paga. Nas Câmaras municipais, a escala é mais contida: presidentes de Lisboa ou Porto recebem 4.604 € (cerca de R$ 28.775,00), e vereadores em regime permanente ficam na faixa dos 3.683 € (cerca de R$ 23.020,00).

Ou seja, na prática, o chefe do Executivo sergipano, responsável por um estado com pouco mais de 2 milhões de habitantes, custa praticamente o mesmo que o Primeiro-Ministro de Portugal, que governa 10 milhões de cidadãos e comanda um orçamento de escala europeia.

No fim das contas, não se trata apenas de números frios em tabelas salariais. O que está em jogo é a lógica de um sistema em que governadores, deputados e prefeitos definem quanto valem a si mesmos, muitas vezes alheios à realidade de quem paga a conta: o contribuinte. Sergipe pode até se orgulhar de ter o maior salário de governador do Brasil, mas o sergipano comum continua se perguntando onde é que esse “padrão europeu” se reflete no dia a dia.

Porque, convenhamos, salário de Primeiro-Ministro até temos — o que falta mesmo é a qualidade de vida que deveria vir junto no pacote.

Tiago Hélcias é jornalista com quase três décadas de vivência no front da notícia — do calor das ruas aos bastidores da política. Atua como apresentador, redator e produtor de conteúdo em rádio, TV e plataformas digitais. É pós-graduado em Marketing Político, especialista em Comunicação Assertiva e mestrando em Comunicação Digital em Portugal.

Aqui no blog, escreve com liberdade, opinião e um compromisso claro: provocar o leitor a pensar fora da caixa.

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