TV GAZETA EM ALAGOAS: MEIO SÉCULO DE HISTÓRIA - UM LEGADO DE DÍVIDAS E INJUSTIÇAS

POR TIAGO HÉLCIAS

Entre a comemoração e a falência moral, a emissora de Collor se despede da Globo deixando um rastro de injustiças.

Na mesma semana em que a TV Gazeta de Alagoas completou meio século de existência, o destino lhe pregou uma ironia cruel: perdeu o sinal da Globo, sua maior fonte de prestígio e relevância. A data que deveria ser comemorada como um marco histórico virou um retrato da decadência de uma emissora que se apequenou diante de seus próprios erros, dívidas e escândalos.

A Gazeta nasceu sob a sombra da política, cresceu com o peso da Rede Globo e atravessou cinco décadas como sinônimo de TV em Alagoas. Mas, no fundo, o que esse aniversário celebra? O legado de 50 anos ou os seis anos de calote denunciados por ex-funcionários que até hoje aguardam na Justiça salários e direitos básicos não pagos?

A queda de uma parceria histórica

O rompimento entre Globo e Gazeta não foi um capricho administrativo. Foi decisão respaldada pelo Supremo Tribunal Federal, que autorizou a emissora carioca a encerrar a afiliação por considerar que a estrutura da TV de Collor foi usada para ocultar dinheiro de origem ilícita. Um recado claro: ética e probidade não são negociáveis.

A informação mais recente é que o Organização Arnon de Mello (OAM), grupo de comunicação da família de Fernando Collor, soma mais de R$ 100 milhões em dívidas. O conglomerado enfrenta bloqueios judiciais e várias ações trabalhistas. 

Parte da dívida está na esfera federal - R$ 32,4 milhões inscritos na dívida ativa da União. Só a TV Gazeta responde por R$ 23,2 milhões desse montante, sendo citada inclusive no processo que levou à condenação de Collor no STF, sob suspeita de uso do canal para recebimento de propinas.

Ex-funcionários cobram salários e indenizações, e a Justiça do Trabalho tem autorizado bloqueios de bens dos sócios, como Collor e sua esposa, Caroline Serejo.

De imediato, a TV Asa Branca assumiu o lugar, inaugurando um novo e promissor ciclo do telejornalismo em Alagoas. Enquanto isso, a Gazeta resistia, ainda que por poucas horas, “pirateando” o sinal da Globo como quem se recusa a aceitar a própria sentença de morte.

Da comemoração à vergonha

Nos bastidores, a realidade é ainda mais dura. Ex-funcionários relatam anos de calote, assédio moral, represálias e portas fechadas. A lista é longa. Jornalistas, técnicos, produtores e operadores foram demitidos sem receber um centavo do que a lei determina. Muitos arrastam processos há mais de meia década.

Nas redes sociais, muitos que já passaram pela TV Gazeta romperam o silêncio e expuseram as feridas abertas pela emissora. Um dos desabafos mais fortes veio da jornalista Priscila Anacleto, que relatou não apenas as dificuldades vividas dentro da empresa, mas também os impactos que ainda carrega até hoje.

Sua fala ecoa como símbolo de uma dor coletiva: a de profissionais que dedicaram anos de suas vidas ao jornalismo alagoano e que foram recompensados com calotes, descaso e silêncio institucional.

Confira o relato

E como se não bastasse o passado, agora o presente também se anuncia cruel: informação extraoficial é de que mais de 80 profissionais que ainda estão na ativa serão demitidos com o fim da parceria com a Globo. Ou seja, a tragédia não é apenas memória de quem já saiu. Ela continua viva, atingindo novas famílias, novos trabalhadores que pagam o preço de uma gestão marcada pela arrogância e pela irresponsabilidade.

Um símbolo de decadência

É impossível olhar para esses 50 anos sem questionar: que grandeza há em uma emissora que comemora meio século ignorando quem a construiu? Que vitória há em um canal que perde seu principal parceiro, carrega dívidas trabalhistas, e vê seu dono condenado no STF por corrupção e lavagem de dinheiro?

A verdade é que a TV Gazeta, ao invés de brindar com orgulho sua trajetória, encerra sua era Globo como um exemplo de como o poder pode ser usado para enriquecer uns poucos e esmagar tantos outros.

Em Alagoas, não se fala de festa, mas de vergonha. Não se fala de vitória, mas de colapso. A Gazeta se despede do sinal da Globo deixando uma herança de dívidas, processos e profissionais abandonados.

E enquanto não houver justiça para os que carregaram essa emissora nas costas, não haverá comemoração. Apenas um epitáfio amargo.

Vale destacar que minha análise não parte de ressentimentos ou disputas de bastidores. Como sabem, atuei em Alagoas por uma emissora concorrente, mas aqui não há espaço para rivalidades tolas ou torcida contra. Não se trata de “eu contra eles”, nem de quem queria derrubar o outro a qualquer custo.

Ali existem profissionais como eu: pais e mães de família, gente trabalhadora que dedicou — e ainda dedica — sua vida à comunicação. Pessoas que agora enfrentam um drama profissional profundo, de incerteza, calote e demissões em massa.

O que se registra aqui não é recalque, é a preocupação legítima com quem está vivendo, na pele, uma das páginas mais duras da história da TV em Alagoas.

Tiago Hélcias é jornalista com quase três décadas de vivência no front da notícia — do calor das ruas aos bastidores da política. Atua como apresentador, redator e produtor de conteúdo em rádio, TV e plataformas digitais. É pós-graduado em Marketing Político, especialista em Comunicação Assertiva e mestrando em Comunicação Digital em Portugal.

Aqui no blog, escreve com liberdade, opinião e um compromisso claro: provocar o leitor a pensar fora da caixa.

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