TJ ALAGOAS NA MIRA DO CNJ: QUANDO A JUSTIÇA VIRA NEGÓCIO DE FAMÍLIA

POR TIAGO HÉLCIAS

Imagine entrar no Tribunal de Justiça de Alagoas num dia comum. Você olha para um lado: um assessor. Para o outro: uma chefe de gabinete. Lá no fundo, um consultor jurídico. E, se perguntar com jeitinho, pode descobrir que todos eles têm um sobrenome em comum com alguém do alto escalão. Coincidência? Talvez. Mas o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) achou a situação um pouco suspeita demais para ser só acaso.

No mais recente relatório de inspeção feito pelo CNJ no TJ de Alagoas, foram identificados nada menos que 79 indícios de nepotismo. Isso mesmo: setenta e nove. Não estamos falando de um ou outro caso isolado. Estamos falando de uma estrutura onde quase dá para montar uma árvore genealógica completa sem sair do gabinete.

O documento, que é oficial e público, fala em vínculos entre magistrados e servidores comissionados, contratos com empresas terceirizadas que empregam parentes e outras relações, digamos, próximas. Tão próximas que, em certos setores do tribunal, parece faltar espaço para quem não leva um sobrenome já conhecido nas rodinhas do poder.

QUANDO O CNJ PASSOU O PENTE FINO NO TJ DE ALAGOAS: A FAMÍLIA TODA TRABALHA LÁ, MENOS O CACHORRO

A inspeção não poupou ninguém. Consta no relatório que há familiares lotados em gabinetes, setores administrativos, comissionados e até em cargos de confiança, com salários robustos e, claro, sem concurso público.

UMA “OPERAÇÃO LIMPA CASA”

Com a bomba estourada em parte da imprensa alagoana, o TJAL correu para limpar a sala antes da visita oficial. Como mostrou o portal “Já É Notícia”, as exonerações começaram em ritmo acelerado, numa espécie de “faxina ética” tardia. Coincidência ou não, algumas exonerações aconteceram horas após a publicação do relatório.

O clima, nos bastidores, é de tensão. Fontes ouvidas pelo referido portal falam até em pressões e articulações para tentar reverter o impacto institucional da ofensiva do CNJ.

ATO CONJUNTO: DECLARE SEU PARENTE OU CAIA FORA

Tentando evitar um vexame ainda maior, o TJAL publicou um Ato Normativo Conjunto, segundo o qual todos os servidores têm 72 horas para declarar oficialmente se possuem algum grau de parentesco com magistrados ou gestores do tribunal. A medida foi noticiada pelo Portal Cada Minuto e também pelo Extra de Alagoas.

O Ato é claro: quem omitir a informação pode ser exonerado e ainda sofrer sanções administrativas. Ou seja, quem escondeu o sobrenome ou usou o nome de solteira achando que ninguém ia notar, agora vai ter que se explicar.

O BRASIL DAS FAMÍLIAS INSTITUCIONAIS

Se Alagoas virou destaque, é porque chamou atenção pelo volume. Mas convenhamos: o nepotismo não nasceu por lá. Ele é quase uma instituição paralela no Brasil.

Mesmo depois da Súmula Vinculante nº 13 do STF, que proíbe a nomeação de parentes em cargos comissionados, o jeitinho brasileiro segue firme. Trocam-se os cargos diretos por empresas terceirizadas, consultorias ou nomeações “técnicas” para burlar a regra. Quando muito, basta dizer que a indicação foi por “competência”, como se talento hereditário fosse genético.

Em Sergipe, por exemplo, denúncias semelhantes já chegaram ao Ministério Público e ao próprio TJSE, com casos de filhos, sobrinhos e cônjuges em cargos estratégicos. A diferença é que, na terra dos cajus, raramente vira escândalo. Às vezes, nem notícia. Mas a pergunta continua ecoando: quantos brasileiros precisam estudar uma vida inteira para disputar uma vaga que, em certas famílias, parece ser herdada no batizado?

E O CNJ, VAI ATÉ ONDE?

O papel do CNJ é fundamental — e corajoso. Mas, como sabemos, o problema não está só em apontar os casos. Está em quebrar a cultura institucional que aceita esse tipo de arranjo como parte do jogo. E aí, meu caro leitor, o buraco é bem mais embaixo.

Porque nepotismo não se resolve só com exoneração. Se combate com transparência, meritocracia e coragem para dizer não aos próprios colegas — algo que, no Judiciário, muitas vezes soa como heresia.

UMA JUSTIÇA DE SOBRENOME É INJUSTIÇA PARA O RESTO

No final das contas, a Justiça só será realmente respeitada quando deixar de parecer uma empresa familiar. Porque quem procura o Judiciário quer isenção — não encontrar um feudo de clãs togados.

A esperança é que o caso do TJ Alagoas não vire só mais um relatório esquecido em alguma gaveta bonita de Brasília. Porque o povo brasileiro merece mais do que isso. E a Constituição também.

Tiago Hélcias é jornalista com quase três décadas de vivência no front da notícia — do calor das ruas aos bastidores da política. Atua como apresentador, redator e produtor de conteúdo em rádio, TV e plataformas digitais. É pós-graduado em Marketing Político, especialista em Comunicação Assertiva e mestrando em Comunicação Digital em Portugal.

Aqui no blog, escreve com liberdade, opinião e um compromisso claro: provocar o leitor a pensar fora da caixa.

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