MORAES AO WASHINGTON POST: A DEMOCRACIA TEM DONO, E ELE NÃO RECUA UM MILÍMETRO

POR TIAGO HÉLCIAS

Alexandre de Moraes resolveu dar entrevista ao Washington Post e saiu de lá com status de “o juiz que não recua um milímetro”. Um título que soa bonito na vitrine, mas que, no estoque, vem com prazo de validade duvidoso. Afinal, não recuar um milímetro é virtude para quem enfrenta ditadores — mas vira vício quando o juiz começa a se comportar como um deles.

O Homem Que Nunca Erra (porque ninguém ousa corrigi-lo)

Moraes fez questão de frisar: suas decisões foram revistas mais de 700 vezes e nenhuma foi derrubada. Zero. Nada. Nem um tropeço. Nem uma vírgula contestada. A perfeição em forma de toga. Cristo multiplicava pães, Moraes multiplica acórdãos.

Só há dois cenários possíveis: ou estamos diante do maior gênio jurídico da história do Ocidente ou seus colegas preferem não comprar briga com o homem que pode transformar qualquer crítico em réu com um simples despacho. Adivinhe qual hipótese parece mais plausível.

A Vacina que Vicia

A metáfora da “vacina contra a autocracia” é quase uma piada pronta. Moraes se coloca como médico, paciente e farmacêutico ao mesmo tempo. Define a dose, aplica a injeção e avalia os resultados. Democracia saudável? Depende. Democracia dependente? Essa já está garantida.

Porque vacina, em tese, é aplicada uma vez e cria imunidade. Mas a de Moraes parece receita de uso contínuo, sem data pra acabar. Enquanto for “necessário”, diz ele. E “necessário” é palavra mágica: cabe tudo, inclusive a eternização de um poder que não aceita auditoria.

O Herói Que Adora a Própria Narrativa

A entrevista é menos um gesto de transparência e mais um recado: ao Brasil, aos EUA, a Bolsonaro, a Eduardo e a quem mais se atrever a discordar. Moraes se apresenta como guardião, mas age como protagonista de reality político: fala grosso, ameaça com processos e sempre arruma um inimigo para manter a narrativa em alta.

O Humor Ácido da Situação

O mais irônico é ver um país que tenta se salvar do autoritarismo entregando sua fé democrática a um xerife que já não admite limites. Um país que diz combater o messianismo, mas corre o risco de trocar o mito de verde e amarelo por outro de toga e caneta.

Estamos diante do guardião da democracia ou do seu fiador exclusivo?

O objetivo de Moraes ao conceder essa entrevista é cristalino: exportar sua imagem de guardião supremo para além das fronteiras brasileiras, blindar-se contra críticas internas com o selo de aprovação estrangeiro e, de quebra, mandar recado para a plateia doméstica de que o seu poder não é apenas jurídico — é diplomático, midiático e, sobretudo, político.

Em resumo, não foi entrevista: foi um ato de marketing togado com direito a público internacional.

Tiago Hélcias é jornalista com quase três décadas de vivência no front da notícia — do calor das ruas aos bastidores da política. Atua como apresentador, redator e produtor de conteúdo em rádio, TV e plataformas digitais. É pós-graduado em Marketing Político, especialista em Comunicação Assertiva e mestrando em Comunicação Digital em Portugal.

Aqui no blog, escreve com liberdade, opinião e um compromisso claro: provocar o leitor a pensar fora da caixa.

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