A SAGA DOS ÔNIBUS ELÉTRICOS EM ARACAJU: ENTRE O TCE/SE E A PREFEITURA - QUEM PAGA A CONTA?
POR TIAGO HÉLCIAS
Aracaju, nossa tranquila capital sergipana, ganhou um roteiro digno de novela das nove — só que sem mocinho e com um vilão bem conhecido: a ineficiência pública. No centro da trama, a prometida revolução no transporte coletivo — os tão falados ônibus elétricos — acabou virando um cabo de guerra entre a Prefeitura de Aracaju e o Tribunal de Contas do Estado de Sergipe (TCE/SE). O que era para ser um avanço sustentável virou denúncia de sobrepreço, guerra de notas oficiais e, claro, o povo como figurante (e sofredor) principal.
Prepare o assento (de preferência, de um ônibus que funcione), porque o que vem a seguir tem mais curva que ladeira do Bairro América.
O Raio-X do TCE: Quando o Fiscal Diz “Parou Aí!”
O TCE resolveu fazer o dever de casa e deu uma fuçada detalhada no processo de aquisição dos veículos. Resultado? Duas medidas cautelares — ou, em bom sergipanês, dois carões públicos.
A primeira aponta indícios de sobrepreço: até R$ 850 mil a mais por unidade, comparando com contratos similares em outras cidades. A conta final? Um possível rombo de R$ 28,5 milhões. Tudo isso fruto de uma adesão a uma ata de registro de preços, que segundo o relator, Conselheiro Flávio Conceição, está recheada de “graves falhas”, cláusulas restritivas à concorrência e descumprimento de exigências contratuais. Em resumo: um prato cheio… para questionamento.
E tem mais: a segunda medida cautelar do TCE/SE recomenda a anulação da concorrência pública para concessão do transporte coletivo. O motivo? A decisão unilateral da prefeita Emília Corrêa, atual presidente do Consórcio Intermunicipal, de simplesmente meter o pé no freio e suspender tudo por conta própria. O TCE não gostou. Chamou de abuso de poder e violação do estatuto. Traduzindo: jogaram sem chamar o VAR.
E o roteiro ficou ainda mais tenso com a cereja do bolo — ou a pedra no sapato, no caso da prefeita: multa de R$ 90 mil se a licitação não for retomada em cinco dias. E os ônibus elétricos? Já foram recolhidos. Sustentabilidade, por ora, só no discurso.
A Versão da Prefeitura: O ICMS, a SMTT e a Defesa que Não Desliga
A Prefeitura de Aracaju foi rápida no contra-ataque. Em nota, reafirmou a legalidade da compra, feita por meio de Ata de Registro de Preços válida e homologada. A SMTT — sempre no meio do tiroteio — ainda ressaltou que a suspensão do certame seguiu orientações anteriores do próprio TCE. Tipo aquele meme: “foi você que me ensinou!”.
Sobre o sobrepreço? A gestão municipal diz que tudo se explica pela alíquota de 19% do ICMS, cobrada em Sergipe — diferente de outros estados, onde há isenção. Ou seja, não dá pra comparar banana com banana sem olhar a etiqueta do supermercado.
A Prefeitura também correu para pedir a isenção ao governo do estado, e jurou de pés juntos que os veículos têm tecnologia de ponta e que o remanejamento da frota anterior vai evitar impactos à população. Será? Ou é mais uma promessa que anda a diesel?
E o Cidadão? Fica no Ponto — Literalmente
No meio de toda essa confusão, quem paga (literalmente) a conta é o cidadão aracajuano. Aquele que esperava por ônibus modernos, silenciosos, menos poluentes e mais pontuais. Agora, assiste de camarote a mais um capítulo do velho embate burocrático entre quem deveria servir e quem deveria fiscalizar.
É a velha máxima: quando o poder público briga, o povo perde o ônibus.
Final ou Reticências?
A novela está longe de acabar. A saga dos ônibus elétricos em Aracaju é o retrato do Brasil real: boas intenções atropeladas por processos mal conduzidos, transparência nebulosa e uma dança de poderes que mais confunde que resolve.
Quem vai vencer essa queda de braço? O TCE? A Prefeitura? Ou a indignação silenciosa do contribuinte cansado de ver promessas se perderem no asfalto quente da cidade?
Ah, e antes que alguém diga que esse assunto é novidade por aqui, não é não. Já falei sobre a chegada dos ônibus elétricos no blog, inclusive comparando custos, eficiência e políticas públicas com a União Europeia e, especialmente, com Portugal — onde moro e acompanho de perto como o transporte sustentável realmente funciona. Se quiser revisitar essa análise e entender por que Aracaju ainda engatinha nesse tema, é só clicar AQUI.
Tiago Hélcias é jornalista com quase três décadas de vivência no front da notícia — do calor das ruas aos bastidores da política. Atua como apresentador, redator e produtor de conteúdo em rádio, TV e plataformas digitais. É pós-graduado em Marketing Político, especialista em Comunicação Assertiva e mestrando em Comunicação Digital em Portugal.
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