BOMBA-RELÓGIO ESTOURADA: COMO A OMISSÃO NA PREVIDÊNCIA TRAVOU ARACAJU NO STF

Por Tiago Hélcias

Acordei em Portugal com mais uma notificação de Aracaju pipocando no celular. Achei que fosse alguma coisa corriqueira, talvez uma obra inaugurada com tapume ainda em pé ou a famosa reforma de praça que começa pelo anúncio. Mas não. Era mais sério — e, ao mesmo tempo, tragicamente previsível: a Certidão de Regularidade Previdenciária (CRP) de Aracaju foi suspensa por decisão do STF.

Na prática? A cidade está impedida de receber qualquer centavo de transferência voluntária da União. Acabou convênio, acabou empréstimo, acabou qualquer possibilidade de investimento com carimbo federal.

Quem disparou o alerta foi a Prefeita Emília Corrêa, que não apenas anunciou o caos, como foi direto ao ponto: a culpa é da gestão anterior. Nas palavras dela, o ex-prefeito Edvaldo Nogueira deixou uma “bomba-relógio”, ignorando a obrigatoriedade, prevista desde 2019, de adequar o regime próprio de previdência do município à reforma nacional.

Veja a publicação no link:

https://www.instagram.com/p/DL4pINVOQEw/?igsh=Mm9xdW5xNWhvODVq

Em vez de atualizar a alíquota dos servidores para os 14% exigidos por lei, Aracaju continuou operando com 11%, como se estivesse imune à legislação federal. O resultado chegou agora, via STF, como uma sentença que diz, com todas as letras: ou você corrige, ou fica fora do jogo.

Um problema antigo ignorado por conveniência política

Antes de virar culpa nas redes sociais, a crise da previdência já estava bem documentada. Os dados da própria prefeitura mostravam, ano após ano, um cenário preocupante:

  1. Arrecadações abaixo das previsões orçamentárias;
  2. Déficits crescentes no regime próprio;
  3. Ausência de reformas estruturais, mesmo após alertas dos órgãos de controle.

E mesmo assim, a gestão passada seguiu apostando na política do “empurra com a barriga”, numa tentativa de evitar desgaste com servidores e sindicatos — afinal, ninguém gosta de ser o prefeito que aumenta alíquota de contribuição, por mais necessário que seja.

A Herança do “Prefeito Perfeito”: Um Olhar para os Números

Os dados oficiais da Prefeitura de Aracaju, disponíveis no Portal da Transparência da Aracaju Previdência, revelam um histórico que merece atenção. Analisando as receitas previdenciárias anteriores a 2015, período que abrange parte significativa da gestão de Edvaldo Nogueira (2006-2012 e 2017-2024), percebe-se a complexidade da situação. Em 2012, por exemplo, as contribuições previdenciárias do Regime Próprio de Previdência (RPPS) tiveram um valor orçado de R$ 34.000.564,35. Já em 2013, o valor orçado foi de R$ 39.059.156,28. Em 2014, os valores foram de R$ 37.890.054,69 arrecadado. Esses números, por si só, não contam toda a história, mas acendem um sinal de alerta sobre a gestão dos recursos previdenciários ao longo dos anos.

Confira os números também no link:

https://transparencia.aracaju.se.gov.br/previdencia/wp-content/uploads/sites/10/2019/11/Receitas_Antes_de_2015.pdf

A falta de adequação à legislação previdenciária, que deveria ter sido feita desde 2019, como apontado por notícias recentes, é um reflexo direto de decisões tomadas no passado que hoje cobram seu preço.

Agora, Emília se vê obrigada a fazer o que Edvaldo não teve coragem de fazer: mandar para a Câmara o projeto que ajusta a alíquota para os 14% exigidos e, de brinde, tentar amenizar o impacto com um reajuste de 3% no salário dos servidores. Chamam de valorização, mas no fundo é paliativo. É como tentar apagar incêndio com borrifador de perfume.

Edvaldo reage e a briga vira espetáculo digital

Diante da acusação pública, Edvaldo Nogueira, claro, não ficou calado. Respondeu no Instagram (a nova arena da política sergipana) dizendo que não é culpado de nada, que sua gestão deixou tudo “organizado” e que o problema é, adivinhe, da atual prefeita que “não agiu a tempo”.

Veja a publicação no link:

https://www.instagram.com/p/DL5xkKQRTV-/?igsh=MWQ4cXltYnNvbTM2bQ==

Ou seja: quem deveria ter resolvido diz que resolveu, quem herdou diz que foi sabotado, e a população, como sempre, assiste a tudo sem saber em quem acreditar.

Mas vamos aos fatos. A lei que obrigava o reajuste da alíquota foi aprovada em 2019. Edvaldo seguiu no cargo até dezembro de 2024. Teve cinco anos para cumprir uma exigência básica. Não fez. Preferiu fingir normalidade enquanto o sistema previdenciário sangrava lentamente. E agora quer posar de injustiçado?

O jornalismo opinativo e a liberdade de questionar

Diante desse enredo repetido, com personagens conhecidos e falas previsíveis, faço aqui um lembrete importante: minha análise é independente e crítica porque é livre. Não devo cargo, não peço licença e não distribuo tapinhas nas costas para manter acesso a informações ou eventos.

Sou jornalista, e faço jornalismo com opinião. Isso incomoda? Ótimo. É sinal de que a crítica tocou onde deveria.

Aracaju vive hoje as consequências de anos de omissão, travestida de eficiência. A CRP não foi suspensa do nada. O STF não acordou de mau humor. A bomba não explodiu por acidente. Foi tudo milimetricamente construído pela gestão passada, que agora tenta terceirizar o desastre. E a atual, ainda sem apresentar um plano realista de saída, começa a repetir o roteiro do improviso.

E agora?

É urgente que a Prefeitura diga como vai reaver a CRP. E com que prazos. A população precisa saber por quanto tempo Aracaju ficará sem recursos federais e quais serão as prioridades enquanto o município estiver na “lista negra”.

Mais do que isso, é preciso apontar quem vai responder pela omissão que trouxe a cidade até aqui. Se não houver responsabilização agora, em breve teremos outro ciclo de promessas, outra gestão jogando culpa no passado e a cidade girando em círculos — como tem feito há décadas.

A previdência virou bomba porque alguém deixou o pavio aceso e saiu andando. E o problema de Aracaju não é só contábil — é de coragem política, de transparência e de verdade.

É imperativo que os mecanismos de controle e fiscalização da gestão pública sejam fortalecidos. O cidadão, munido de informações e com canais efetivos para denunciar irregularidades, é a última linha de defesa contra a má gestão. A transparência radical, a responsabilização dos envolvidos e a implementação de reformas previdenciárias justas e sustentáveis são passos cruciais para que Aracaju possa, finalmente, respirar aliviada e garantir um futuro digno para seus habitantes. A previdência não é um detalhe; é a garantia de um amanhã que não pode ser refém de um passado mal gerido.

Aqui de Portugal, sigo atento. Porque oceano nenhum impede quem tem compromisso com a notícia — e menos ainda quem escolheu fazer jornalismo sem coleira.

aguardemos as cenas dos próximos capítulos.

Tiago Hélcias é jornalista com quase três décadas de vivência no front da notícia — do calor das ruas aos bastidores da política. Atua como apresentador, redator e produtor de conteúdo em rádio, TV e plataformas digitais. É pós-graduado em Marketing Político, especialista em Comunicação Assertiva e mestrando em Comunicação Digital em Portugal.

Aqui no blog, escreve com liberdade, opinião e um compromisso claro: provocar o leitor a pensar fora da caixa.

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